Por Paulo Perrotti | 10/03/2023 ás 02h26 | Atualizado 05/04/2024 ás 10h32

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Fair Trade e ESG: Entenda como as principais vinícolas do Brasil se envolveram em um caso de trabalho escravo

Fair Trade e ESG: Entenda como as principais vinícolas do Brasil se envolveram em um caso de trabalho escravo


O Ministério Público do Trabalho (MPT) firmou ontem, 9.3.2023, um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com as Vinícolas Aurora, Garibaldi e Salton, que contratavam os serviços terceirizados da Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda, empresa flagrada mantendo trabalhadores em condições degradantes em um alojamento em Bento Gonçalves, na sua maioria oriundos do Estado da Bahia, em operação de resgate realizada no último dia 22 de fevereiro.

O acordo foi elaborado levando em consideração responsabilidade que o setor econômico tem de capacitação, fiscalização e monitoramento de toda a cadeia de produção. Entre as obrigações, ficou estabelecido que as empresas devem zelar pela obediência de princípios éticos ao contratar trabalhadores diretamente ou de forma terceirizada: abster-se de participar ou praticar aliciamento, de manter ou admitir trabalhadores por meios contrários à legislação do trabalho, de utilizar os serviços de empresas de recrutamento inidôneas. As empresas também se responsabilizar por garantir e fiscalizar a áreas de alojamentos, vivência e fornecimento de alimentação.

Outras das disposições contemplam a obrigatoriedade de as empresas só firmarem contratos de terceirização com empresas com capacidade econômica compatível com a execução do serviço contratado, de fiscalizar as medidas de proteção à saúde e à segurança do trabalho adotadas pelas terceirizadas e também exigir e fiscalizar o regular registro em carteira de todos os trabalhadores contratados para prestação de serviços, bem como os pagamentos de salários e verbas rescisórias. Também é papel das empresas no acordo promover, entre outras empresas do setor vinícola e entre associados de suas cooperativas, estratégias de conscientização e orientação, contemplando seminários sobre boas práticas e cumprimento de legislação sobre direitos trabalhistas e direitos humanos, inclusive abordando temas de segurança, saúde e medicina do trabalho e trabalho em condições análogas à de escravo.

O descumprimento de cada cláusula será passível de punição com multa de até R$ 300 mil, cumulativas, a cada constatação.

O fato é que a cadeia de fornecimento impacta diretamente na produção de qualquer tipo de produto ou serviço e não é possível permitir que haja qualquer tipo de contaminação nesta rede de Supply Chain, que deve ser monitorada e audita, a fim de garantir que as melhores práticas sociais, ambientais e governança sejam adotadas no processo de compras.

Neste mesmo contexto, a Zara, uma das principais marcas multinacionais do mercado de moda, reconheceu em 2014 que havia trabalho escravo em sua cadeia produtiva, na medida que utilizava confecções terceirizadas que mantinham trabalhadores em regime análogo à escravidão. Após a confissão, a Zara firmou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) e vem cumprindo uma extensa lista de ações para evitar que o erro se repita.

Neste sentido, é essencial que as empresas desenvolvam Programas de Compras Sustentáveis, e, para tanto, utilizem critérios e tecnologia para apoiar no desenvolvimento da fundamentação e estruturação da estratégia de compras sustentáveis, permitindo que a empresa tenha maior controle sistemática na redução de riscos na gestão da sua cadeia de valor.

A empresa que é passiva na análise das iniciativas de ESG (Environment, Social & Governance ou, em um tradução literal, Sustentabilidade Ambiental, Social e Governança Corporativa) de sua cadeia de fornecimento, na verdade, atua de forma negligente, na medida que não integra nas suas métricas aspectos socioambientais à gestão de suprimentos, permitindo mapear os potenciais riscos à empresa de cada categoria de produtos e serviços e o nível de criticidade dos fornecedores no âmbito socioambiental.

Assim, se faz necessário diagnosticar e provar, com evidências documentais, a definição de iniciativas de gestão específicas e adequadas à classificação de riscos de cada fornecedor, no que se refere aos aspectos socioambientais à gestão de suprimentos.

Por fim, como é possível observar, além do impacto negativo reputacional, há infrações regulatórias punitivas que podem ser aplicadas no caso de desrespeito às boas práticas de ESG. E só há uma forma de se mitigar este risco: a capacitação e o monitoramento da cadeia de suprimento. Caso contrário, a empresa estará negligenciando seu compromisso ético e regulatório com a comunidade.

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