Por Erica Riera | 03/08/2023 ás 09h00 | Atualizado 04/08/2023 ás 06h59

6min de leitura

Desvendando o Agile Procurement

Desvendando o Agile Procurement

Como tornar a área de Compras mais estratégica

Parte 1

As preocupações sobre como as empresas estão se adaptando a um mundo volátil e incerto têm sido amplamente debatidas já que disso depende a sua sobrevivência financeira, a longevidade de seus produtos e a satisfação de seus clientes. Portanto, as empresas precisam adotar processos empreendedores para promover uma renovação estratégica e no tempo apropriado.

Diante deste desafio, uma das maneiras pelas quais as organizações se mantêm no mercado é tornando-se mais resilientes diante das mudanças. Isso implica em ser ágil ao identificar os riscos na cadeia de suprimentos e tornar os contratos com fornecedores mais flexíveis e eficazes.

Aprofundando um pouco mais esses conceitos, viver em um mundo onde a mudança é constante e imprevisível apresenta desafios sobre como agir diante de tamanha incerteza. A velocidade dos avanços tecnológicos e seu impacto nos comportamentos está aumentando cada vez mais rápido, afetando tanto os produtos e serviços oferecidos pelas empresas quanto a forma como elas se estruturam para fornecê-los.

A agilidade empresarial, ou Business Agility, refere-se à capacidade das organizações de adaptarem rapidamente seus negócios e processos além do nível normal de flexibilidade, permitindo a gestão efetiva de eventos internos e externos altamente incertos e inesperados, que podem ter consequências significativas caso não recebam a atenção que merecem o tempo que adequado.

Ou seja, nesse contexto de transformação, é crucial que as organizações enfatizem a resiliência para enfrentar um ambiente de negócios atual. Isso implica em uma adaptação da cadeia de suprimentos para lidar com interrupções inesperadas e tornar-se igualmente resiliente. Significa que todos os envolvidos na cadeia devem desenvolver capacidades de resposta por meio de flexibilidade e redundância para se recuperar de perturbações ou para atender às constantes mudanças impostas pelo mercado e pelos consumidores, estes através de estratégias de Customer Centricity (o cliente no centro das decisões, desde o desenvolvimento de produtos até a oferta de serviços e o atendimento).

Compras também deve ter Business Agility e ser Customer Centricity

De nada adianta a empresa adotar uma posição Customer Centric se as suas áreas ou departamentos não aderirem a esta cultura e continuarem a pensar em silos impedindo o Business Agility, dentre outras situações.

Pensando historicamente, seria natural que houvesse uma convergência entre os processos de Compras e os conceitos de Agilidade já que muitas das suas metodologias foram absorvidas das práticas do Lean Manufacturing e, como sabemos, tanto Manufatura como Compras fazem parte da cadeia de fornecimento (Supply Chain).

Além disso, Compras tem convivido ao longo dos anos com requisitantes diretos ou indiretos tanto da manufatura como da área de tecnologia, de onde surgiu o Manifesto Ágil. Ou seja, por um lado ou outro, a Agilidade deveria fazer parte do dia a dia de Compras. Mas porque Compras está distante dessa transformação? Porque não tem Business Agility?

Um dos grandes motivos foi que ao longo dos anos Compras foi se adaptando para atender questões de Compliance que tornaram tudo absurdamente burocrático, mesmo em situações que não eram necessárias (observação: sabemos que em alguns casos estes passos são necessários, veremos isso mais a frente, na parte 2).

Ou seja, para resolver um problema detectado no passado com a intenção de que não se repetisse, criaram-se passos que nunca mais foram revistos ou que hoje, através de novos sistemas, ERPs, etc já estão mitigados de forma automática. Seria como tornar a exceção, a regra, ou como dizem, “usar balas de canhão para matar formigas”. E assim, com o passar do tempo, os fluxos de Compras se tornaram um pesadelo para quem quer adquirir algum produto ou serviço, até mesmo para os compradores, com caminhos complexos e cheios de variáveis, políticas com dezenas de páginas, que poucos leem, ERPs com várias páginas e um ciclo vicioso de problemas que os dois lados enfrentam diariamente.

Além disso, a visão de cliente interno se perdeu e a própria área de Compras deixou de se classificar como uma área que atende à demandas e se tornou um “ente” a ser atendido, já que, caso não o fosse, haveria algo “suspeito” ou, minimamente, “um desvio” a ser reportado.

Ninguém nega a importância da área e sua questão estratégica para os resultados e tudo mais que fazemos, mas é importante reconhecer que, ao longo dos anos, em algumas empresas, alguma coisa saiu do trilho e a relação cliente/prestador foi sendo invertida, trazendo aos requisitantes a impressão de que Compras não é parceira.

Paralelamente, em muitos casos, esta situação também colocou os compradores numa situação relativamente confortável já que eles passaram a se “esconder” atrás desta regulação, tornando seu trabalho processual, cheio de respostas prontas, e que hoje em dia se encontra fortemente ameaçado pela robotização dos ERPs.

Transformar esta situação exige que a visão tradicional do papel de Compras de gerar savings. Essa abordagem envolve a compreensão aprofundada, no caso de Compras, da demanda do cliente, suas necessidades, expectativas e desafios, com o objetivo de criar entregas que sejam verdadeiramente relevantes e satisfatórias.

Ou seja, trabalhar com a estratégia de Customer Centricity – o que vocês verão fortemente no primeiro valor do Manifesto Ágil - vai além de apenas entregar um pedido ou contrato abaixo do orçamento disponível, trata-se de construir uma relação de confiança com o cliente interno, demonstrando que suas necessidades são levadas a sério e que a área está comprometida em resolver seus problemas e superar suas expectativas.

E, assim por diante, os valores do Manifesto Ágil, adaptados ao vocabulário e modo de operação de Compras, entra como um guia, a exemplo do que fez com os processos de desenvolvimento de software, conectando e amarrando todos estes conceitos e dando suporte às ações a serem tomadas.

Quando uma área de Compras adota o Agile Procurement, além dos resultados já praticados atualmente, também se procura atender a situações que agreguem valor ao cliente como, por exemplo: tempo apropriado de entrada no mercado para início das RFX (tempo de resposta às demandas dos requisitantes); foco em atender as necessidades de cada compra de maneira específica (vamos explicar melhor na parte 2), capacidade de inovação interna e na busca por melhores entregas e fornecedores; além de se posicionar com um comportamento compatível ao de um prestador de serviços aos clientes internos, melhorando experiência deles desde o momento de inclusão da requisição no sistema até o recebimento do produto ou serviço.

E, num ciclo virtuoso, Compras entregará mais valor, destacando a importância de considerar o valor fornecido aos seus clientes, que por sua vez entregarão aos seus respectivos clientes internos ou externos e a natureza cada vez mais não sequencial dos processos organizacionais.



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